sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Reflexões

O Deus que surpreende
Todos conhecem a história de Jó. Aquele homem justo foi duramente provado por Deus. Estavam em jogo as motivações de Jó em servir a Deus. O argumento de Deus era o de que Jó era um homem inigualável na terra. Justo, fiel, íntegro, um verdadeiro exemplo. Satanás, que passava diante de Deus, colocou em dúvida a visão divina, propondo que a relação que Jó mantinha com Deus era movida por interesse.
No primeiro ato, por permissão de Deus, Jó perdeu seus filhos e todos os seus bens. A frase é pequena para tamanha desgraça, mas a dor por certo foi muito grande. Jó, todavia, manteve-se fiel e disse: “Saí nu do ventre da minha mãe, e nu partirei.” Diante de tamanha desgraça, Jó conseguiu desbancar o argumento do tentador.
Ao se apresentar novamente a Deus, Satanás propõe que fidelidade de Jó se firmava no fato de ele ter saúde. Então, no segundo ato, novamente por permissão divina, Jó foi acometido de uma enfermidade terrível, a ponto de precisar viver afastado dos amigos, em vista das terríveis dores e até do mau cheiro de suas feridas. Novamente Jó surpreendeu. Manteve-se fiel a Deus e disse: “Aceitaremos o bem dado por Deus, e não o mal?”
Começa o terceiro ato. Nele os amigos de Jó vêm estar com ele, argumentando a respeito da sua situação e referindo-se a possíveis causas. A tese dos amigos era a de que Jó pecara contra Deus e por isso sofria aquelas mazelas. Jó, ao contrário, tinha convicção de sua integridade e de que seu sofrimento seria debalde.
Inicialmente, em sua defesa, Jó estava convicto de que sua justiça não fora suficiente para evitar seu mal. Ele disse: “Mas como pode o mortal ser justo diante de Deus? Ainda que quisesse discutir com ele, não conseguiria argumentar nem uma vez em mil.” Jó reconheceu a grandeza de Deus, a ponto de evitar imputar-lhe qualquer responsabilidade sobre seu sofrimento.
Os amigos de Jó mantinham o discurso. Jó pecou e por isso sofria. Jó continuava se defendendo; era inocente. A discussão chegou a um nível insuportável, a ponto de Jó declarar: “Esses discursos inúteis nunca terminarão? Até quando continuarão a atormentar-me, e a esmagar-me com palavras? Vocês já me repreenderam dez vezes; não se envergonham de agredir-me! Se é verdade que me desviei, meu erro só interessa a mim.”
Acontece, então, algo inesperado. Jó passou a reclamar a respeito do comportamento do Senhor: “Deus fez-me cair nas mãos dos ímpios e atirou-me nas garras dos maus. Eu estava tranqüilo, mas ele me arrebentou; agarrou-me pelo pescoço e esmagou-me.”
Em seguida, passou a acusá-lo. Talvez enfurecido pelas constantes acusações de seus amigos, Jó começou a agredir a Deus: “saibam que foi Deus que me tratou mal e me envolveu em sua rede. Se grito: é injustiça! Não obtenho resposta; clamo por socorro, todavia não há justiça. Ele bloqueou o meu caminho, e não consigo passar; cobriu de trevas as minhas veredas. Despiu-me da minha honra e tirou a coroa de minha cabeça.”
Mais do que agredir, Jó passou a duvidar do cuidado de Deus a seu respeito. Sua relação antes fortalecida pelas constantes bênçãos do Senhor, agora é colocada em cheque: “Como tenho saudade dos meses que se passaram, dos dias em que Deus cuidava de mim, quando sua lâmpada brilhava sobre a minha cabeça e por sua luz eu caminhava em meio às trevas! Como tenho saudade dos dias do meu vigor, quando a amizade de Deus abençoava a minha casa, quando o Todo-poderoso ainda estava comigo...”
E Jó não parou por aí. Propôs a apresentar sua defesa diante de Deus: “Se tão-somente soubesse onde encontrá-lo e como ir à sua habitação! Eu lhe apresentaria a minha causa e encheria a minha boca de argumentos. Estudaria o que ele me respondesse e analisaria o que me dissesse. Será que ele se oporia a mim com grande poder? Não, ele não me faria acusações. O homem íntegro poderia apresentar-lhe sua causa; eu seria liberto para sempre de quem me julga.”
Jó, embora íntegro na visão do próprio Deus, estabeleceu uma linha de auto justificação. Ao invés de manter sua visão inicial acertada a respeito de sua submissão a Deus, mesmo diante de um terrível pesadelo, preferiu desafiar ao Senhor, propondo uma alternativa impossível: apresentar sua defesa diante daquele que conhece todas as coisas.
Jó acreditou que Deus o havia abandonado, mas, do céu, o Senhor acompanhou todas aquelas cenas. As acusações dos amigos de Jó; sua defesa inicial e depois um discurso de revolta contra o próprio Deus. O todo poderoso permaneceu em silêncio, aguardando sua vez. Até que, em determinado momento, resolveu apresentar-se a seu servo do meio de uma tempestade.
Deus questionou Jó: “Quem é esse que obscurece o meu conselho com palavras sem conhecimento? Prepara-se como simples homem; vou fazer-lhe perguntas, e você me responderá. Onde você estava quando lancei os alicerces da terra? Responda-me, se é que você sabe tanto. Quem marcou os limites das suas dimensões? Talvez você saiba! E quem estendeu sobre ela a linha de medir? E os seus fundamentos sobre o que foram postos? E quem colocou sua pedra de esquina, enquanto as estrelas matutinas juntas cantavam e todos os anjos regozijavam?...”
Deus continuou: “Aquele que contende com o todo poderoso poderá repreendê-lo? Que responda a Deus aquela que o acusa... Prepare-se como simples homem que é; eu lhe farei perguntas, e você me responderá. Você vai por em dúvida a minha justiça? Vai condenar-me para justificar-se? Seu braço é como o de Deus, e sua voz pode trovejar como a dele?... Então admitirei que a sua mão direita pode salvar você.”
Jó foi surpreendido por Deus. Diante das perguntas do Senhor, para as quais Jó não teria respostas, foi inevitável reconhecer o seu erro: “Sei que poder fazer todas as coisas; nenhum dos teus planos pode ser frustado. Tu perguntaste: “Quem é esse que obscurece o meu conselho sem conhecimento?” Certo é que falei de coisas que eu não entendia, coisas tão maravilhosas que eu não poderia saber.”
A experiência vivenciada por Jó foi uma das mais profundas de toda a história bíblica. E Jó conseguiu compreender o propósito de Deus. Não fora à toa o seu sofrimento; na verdade, Deus desejava um relacionamento mais próximo, uma relação muito mais íntima. Depois disso, Deus abençoou a vida de Jó mais do que no início. Restituiu-lhe todos os bens e deu-lhe filhos. Jó então reconheceu que sua relação com Deus (apenas de ouvir) passara para um nível mais profundo: a de estar junto: "Meus ouvidos já tinham ouvido a teu respeito, mas agora os meus olhos te viram.”

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